terça-feira, 20 de maio de 2008
_ ROGATÓRIO _
daí-me , senhor :
uma qualquer fatia de tempo sem uivos , sem gemidos
uma parte de alma que me falta , arrancada no grito
dái-me o credo como ungüento para essa minha fé rasgada
e o poente, senhor, para os joelhos vergados na hora sacra
daí-me, senhor:
uma tarde plena de borboletas lépidas e serenas
dai-me a palavra desnuda de iniqüidades e dor
semeia , senhor , no meu olhar a quietude de lírios dos campos
livrai-me ,suplico, do clamor dos inocentes e dos proscritos
do azeite e do vinho vertidos nas catedrais da ignomínia
dai-me o esquecimento das epistolas flácidas dos sacerdotes
de oficio pirotécnico ,carnavalesco e ensandecido
poupai-me, senhor,
da miséria dos desprezíveis
do ventre prenhe da menina de rua
dos maltrapilhos amontoados nos albergues e abrigos
das mães da sé chorando seus filhos
do lixo-homem queimando nas calçadas
de todas as izabelas agonizantes nos meus dias
para minha memória , dai-me senhor
a memória mais completa do esquecimento esquecido
e um jardim de pedras, sem flores ,sem passos, sem risos
dai-me, senhor ,uma noite de sono:
- preciso!
domingo, 18 de maio de 2008
_súplica _
quando partires de mim
leva os teus restos e tuas sombras
leva teus discos ,teus livros ,teus passos
quando partires de mim
desate teus nós, arranque teus laços
afogue os retratos , mate os abraços
quando partires de mim
deixa-me a tardes de sol pelas trilhas da tijuca
deixa o meu olhar sobre o mirante do leblon
e minhas asas flanando na pedra da gávea
quando partires de mim
deixa-me a chuva no rosto, os pés descalços na praia
e esta vontade infinita de voar livre de saudades
deixa- me também vazia de lágrimas
quando partires de mim:
_ definitivamente, deixa-me!
nanamerij
sábado, 17 de maio de 2008
Cantigas de Amigos
Cantigas de Amigos
_ na fina pedra sinto o teu sorriso: _
José Félix
-e fica a visão de tua imagem
no perfume desta aragem
balançando memórias no vôo retilíneo
das gaivotas amoradas com azuis
que tocam o acaso da vida
na vida que toca em nós
e fica a lua velando nossos sonhos
que adormecem meninos
apesar deste distante olhar sobre o tempo que já não é
e mudo teu corpo caminha e se desmembra
restituindo o silêncio das horas que te configuram
e te sugerem entre gestos interrompidos :
_na fina pedra perpetuadas as marcas do teu sorriso
nanamerij
maio/2008
_ainda te pressinto em cada esquina!
nanamerij
na fina pedra sinto
o teu sorriso.
as dálias, no jarrão
de porcelana
têm a marca
dos teus dedos finos
despetalando a corola da flor.
o pedúnculo solitário e grave
é a trave dos ossos
carcomidos
na admiração da vida ao acaso.
é o teu rosto
que me ruga a face
e me contempla a existência dada.
josé félix
2008.517
_ poema debruçado sobre ossos _
sem vigília a palavra se desgarra
lacra as sobras de vida em mim
inunda olhares e se debruça no poema
sobre os ossos da memória em estio
tudo teu é soterrado:
_ tua voz
_ teu cheiro
_ teu veneno
de teu rosto já não me lembro
perdi lembranças das tuas mãos
esqueci o amanhecer de teus olhos
o passado não me abre suas portas
nem me diz por onde caminhas
mas...
_ainda te pressinto em cada esquina!
nanamerij
fevereiro/2008
terça-feira, 6 de maio de 2008
_ antropofagia _
_ antropofagia _
flexível como haste do salgueiro,ela vibra . em suas mãos sabores vermelhos e danças da noite atiçam todas as labaredas de sua fome que passeia e desliza entre vertigens e fé .
pelo sacrário da carne escoam todos os seus afluentes " na hora do desejo",chama que arde na pele do vento, do tempo.
na sua da boca farta de inventos, doçuras e iras. ela grita avessos,ausências e espinhos que ferem a seda.
nua cavalga o amor até prover pleno esquecimento de si ,liquida persegue o gozo como quem persegue tulipas ,embriagada e interdita,bebe do vinho,come da carne :- fêmea, santifica-se !
Amina Ruthar
_ notícias da casa paterna _
( esta foto é da cidadezinha onde nasci)
_ notícias da casa paterna _
vozes escorrem pelas artérias da casa
súplicas das almas de sonhos, outrora nossos:
-a memória está lá, em pele e ossos
a vista nua, não verás passos de infâncias
a farfalhar alegrias nas retinas dos corredores:
- mas estão lá, gravados nas veias das manhãs
em letra rubra no pergaminho das horas
o solo de nossa história é lágrima nos objetos calados
luto perpétuo por todo azul escrito um dia
no musgo do tempo notícias de ser feliz não há:
_ nem de deus!
Amina Ruthar
_ uma prece,um grito, um recado _
_ uma prece,um grito, um recado _
( para Amélia Pais, mestra maior)
sou sertão, veredas
sou as curvas e caminhos do serrado
leio-te nas leiras áridas do solo infértil do meu querer agreste
meus atalhos são poemas ávidos de sede
onde a seca mata e fere
sou terra trincada , ventre vazio
fiqueira seca onde o amor não vingou
carrego a gana do mundo pelas quebradas do mapa
que encolhe o chão e mata esperança e fé
sou aquela que um dia esquecestes numa qualquer estrada
sem aviso, sem bilhetes, sem recados
de minha romaria não sabes sequer um pedaço
menos conheces do meu grito infame,sou :
_ esta morta de fome!
nanamerij
sexta-feira, 2 de maio de 2008
desdita
amor sem qualquer pudor
arditie
a lágrima acorrentada sufoca
caco de vidro no lado esquerdo do peito
espinho de peixe na palavra retida
no profundo do medo o inviável perdão
que agoniza árido de vontades
lâmina afiada sangrando a poesia
morro –me pedra no meio fio
sem qualquer trava no caminho
escorrem-me ainda fera ferida
sobras de amor agreste,seco rio
morro-me assim...despercebida!
nanamerij
permanências
...nas minhas retinas pairam incompletudes
lágrimas de um tempo sem terminar
trago algas nas mãos para cerzir saudades
e este jeito azul de ainda te olhar
por isto,
nos meus lábios o sal eterno de gosto mar!
ainda te espero no porto -esperança
enquanto sagro preces para iemanjá
quem sabe voltas na compaixão das ondas
num qualquer marear...
assim velo-te
nos lábios sal de gosto - mar
e o jeito longe de azul- olhar!
nanamerij
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